UM ALMOÇO SOBRE HERMAN, ERNEST E A VIDA
(por Alessandro Loiola)
Para Aristóteles, nenhuma honra é maior do que ter um amigo. E podemos nos considerar bem sucedidos quando conseguimos contar nos dedos mãos os amigos que realmente valem nosso tempo: eles são sempre muito raros e escassos – tanto os amigos quanto o tempo.
Ao longo de quase 5 décadas nesse mundo, consegui encontrar alguns desses. Dia desses, saí para almoçar com um representante deste distinto clube. É sempre um grande prazer desfrutar da companhia dele.
Durante o almoço, conversamos sobre várias coisas, dentre elas Literatura. E falamos sobre as metáforas ocultas em livros clássicos – especialmente nas obras mais famosas de Herman Melville e Ernest Hemingway.
Como você provavelmente não estava presente no encontro, repasso aqui o que foi debatido na presença de uma excelente garrafa de vinho. Quem sabe, essa reflexão seja útil para você:
Melville foi um escritor peculiar. Apesar de ter obtido grande sucesso no início da carreira, sua popularidade encolheu com os anos. Quando faleceu, Herman um quase completo desconhecido.
Melville teve que começar a trabalhar cedo para ajudar no sustento da família, atuando como agricultor, bancário e professor. Em 1841, aos 22 anos de idade, embarcou no baleeiro Acushnet e percorreu extensões enormes do Oceano Pacífico.
Seus livros quase sempre misturavam experiências vividas pelo autor com insights subliminares sobre a natureza humana e nossa existência neste planeta. Provavelmente, foi a experiência a bordo do Acushnet que levou Melville a escrever Moby Dick, sua obra mais conhecida. Publicado em Londres em 1851, Moby Dick foi um fracasso absoluto de vendas à época do lançamento – mas Moby Dick tem a melhor abertura de todos os livros que já li: “Me chame de Ishmael”. Simples e eficaz e misterioso.
Hemingway, nascido 8 anos após a morte de Melville, percorreu caminhos literários parecidos aos de Herman: seus romances em geral retratavam bagagens de vida do autor permeadas por reflexões existenciais – e uma economia inquietante de adjetivos.
Hemingway viveu na Espanha por quatro anos e chegou a tourear como amador, uma vivência emocional que abordaria em O Sol Também Se Levanta (1926).
Quando a Primeira Guerra Mundial estourou, Hemingway tentou alistar-se no exército, mas foi recusado por ter um problema na visão. Decidido a ir à guerra, conseguiu uma vaga de motorista de ambulância na Cruz Vermelha. Uma vez na Itália, apaixonou-se pela enfermeira Agnes Von Kurowsky, que viria a ser sua inspiração para a criação da heroína de Adeus às Armas (1929).
Anos mais tarde, trabalhou como correspondente de guerra em Madri durante a Guerra Civil Espanhola (1936-1939), obtendo a inspiração para uma de suas maiores obras, Por Quem os Sinos Dobram (1940).
No final da década de 1930, Hemingway resolveu partir com um amigo para uma pescaria. Os dois dias em alto-mar terminaram em Havana, Cuba, para onde o escritor passou a voltar anualmente na época da pesca ao marlim, entre os meses de maio e julho. Essa experiência foi a base para a elaboração de sua obra que considero minha predileta : O Velho e o Mar, publicado em 1952. Por este livro, Hemingway ganhou o Prémio Pulitzer de Ficção (1953). Dois anos depois, seria laureado com o Nobel de Literatura.
Separados por quase exatos 100 anos, Moby Dick e O Velho e o Mar compartilham uma temática extremamente semelhante: os humanos, ansiosos por um sentido, se lançam contra a incerteza para arrancar algo da existência. Em ambos os livros, a incerteza é o Mar; e a existência, um ser que habita nele.
Ahab quer acertar as contas com o cachalote Moby Dick. O velho Santiago deseja arrastar para a praia um marlim muito maior que seu barco e suas forças podem suportar. Ambos enfrentam a incerteza acreditando que estão seguindo o que consideram o sentido de suas vidas. Ambos constatam que o destino de suas ambições não guarda apenas flores, mas também espinhos. Ambos naufragam, de algum modo.
Ko'proq ko'rsatish ...